Logo no início da entrevista, Max Folly (33) corrige o jornalista, ele afirma que não se identifica como homem, mas como transmasculino. Seguro em suas palavras, Max possui um discurso forte e fala com propriedade sobre vários temas. Vivendo em Berlim há três anos, Folly trabalha como DJ e, apesar de se sentir muito mais seguro em solo alemão do que em terras cariocas, passou por xenofobia na Europa.
Quando percebeu que Bolsonaro venceria as eleições, Max trocou o Brasil pela Alemanha, pois já previa que seria difícil a situação para a comunidade LGBT no país.

Com que idade você se identificou sendo homem?
Não me identifico como homem, me identifico como transmasculino. Questiono minha identidade de gênero desde que me entendo por gente.
Como foi a sua infância no Rio de Janeiro?
Bem difícil. Sempre fui uma pessoa de apresentação bastante masculina e nunca fui magro. Antes de me relacionar romanticamente ou sexualmente com as pessoas, eu já entendia bem o que era ser rejeitado por ser quem eu sou no meu círculo familiar e de amizades. O ensino fundamental/médio é uma fábrica de pesadelos pra qualquer pessoa que não se encaixe no espectro binário que foi colocada.
E sua família como reagiu quando soube, teve o apoio deles?
Não tive apoio da minha família nem quando me identificava como lésbica. Fui aos poucos separando minha vida íntima/emocional da vida deles para me sentir melhor e me remover da necessidade de aprovação que é construída/ensinada pelo núcleo familiar e reforçada pela mídia. Isso me fez muito bem, me voltei para pessoas que tinham melhores condições de me apoiar durante minha transição. Olho para trás e vejo que foi uma decisão ótima, é muito importante ter pessoas acolhedoras por perto quando se passa por isso. As estruturas políticas e sociais, o mundo inteiro já está contra você, é importante ter alguém do seu lado.
Você chegou a ser vítima de transfobia no Rio?
Toda pessoa trans, em vários momentos, é vítima de transfobia, em menor ou maior grau. Frequentemente, o primeiro contato que as pessoas trans têm com esse tipo de preconceito é quando você muda seu pronome. A maioria das pessoas que não tem convívio com pessoas trans tem muita dificuldade de respeitar isso, especialmente se a pessoa não for passável. É muito desmotivante ter seu pronome e sua identidade desrespeitada diariamente.
Como surgiu a oportunidade de viver na Alemanha? É uma chance que poucas pessoas têm e, possivelmente, muitas pessoas trans têm esse desejo de viver na Europa pela segurança.
Vim para Berlim no meio de 2017, nas pré-eleições. Eu suspeitava que o Bolsonaro iria vencer e por isso sabia que ficar no Brasil seria muito difícil. A extrema-direita e, em específico o Bolsonaro, está tornando a vida no Brasil em um inferno para qualquer pessoa, especialmente para as pessoas trans. Eu aconselho a todo mundo que tenha vontade e condição de sair do Brasil, que o faça. Mas se engana quem acha que vir para a Europa é um passagem para o fim da transfobia.

Se sente seguro em Berlim?
Me sinto um milhão de vezes mais seguro do que no Brasil, mas eu passei por uma trajetória bem específica: quando eu estava no Brasil, as pessoas me reconheciam como uma mulher cis branca. Assim que eu me mudei para a Europa, o meu tratamento hormonal começou a dar resultados físicos, então assim que eu virei “homem” no olhar dos outros, eu também virei um imigrante latino. Ou seja, assim que eu ganhei o privilégio da passabilidade cis masculina, de outro lado eu passei a ser racializado. Passo por várias situações de xenofobia aqui que eu jamais passaria no Brasil. Não é incomum pessoas não-caucasianas viverem situações de racismo aqui. Eu atribuo as agressões que eu sofro muito mais à xenofobia do que ao racismo, mas são coisas que estão bem conectadas. Um caso bastante desagradável foi uma vez que fui ao Berghain, um homem propositalmente veio de encontro a mim, quando perguntei o porquê ele fez isso, ele me disse em alemão que ele trabalhava lá e que eu estava fodido. Ele me pegou pelo pescoço, me arrastou pelo clube sem motivo algum e me expulsou enquanto falava para eu “ir embora da Alemanha”.
E há transfobia na Alemanha?
Sim. A vida é cheia de processos burocráticos, especialmente quando se é imigrante e antes de mudar meu nome legalmente, passei por várias situações desconfortáveis. Mas não é só em instituições burocráticas, a cena gay/queer aqui tem bastante gente que se acha desconstruídissima, mas é extremamente transfóbica em vários aspectos. Transfobia não é só agredir fisicamente/verbalmente uma pessoa trans. A exclusão é também uma forma de agressão.
Você trabalha no coletivo “No Shade“, conte mais sobre o projeto.
O No Shade é um coletivo que faz mentorias de DJing e VJing e também uma série de festas para pessoas femme, trans e não-binárias em Berlim, mas temos vontade de fazer parcerias internacionais. Atualmente somos 12 pessoas, 11 DJs e uma VJ. Atuo no coletivo principalmente como DJ/mentor/curador sob o nome de Folly Ghost. Estamos com um projeto legal no forno, o No Shade TV, que reúne vários programas de formatos e temas diferentes, por enquanto estou coordenando/curando dois deles.
Você tem planos de um dia voltar a viver no Brasil?
Não, mas sempre quando possível quero poder voltar para ficar cerca de um mês ou mais. Infelizmente a primeira vez que eu fiz isso foi pouco antes da pandemia se espalhar no Brasil.
Max Folly nas redes sociais:
www.instagram.com/follyghost
www.facebook.com/follyghost
www.soundcloud.com/follyghost
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