Formada no final da década de 1990, a Banda Rosa-Choque fez sucesso imediato com o “Rap do Marcelinho”, hit conhecido pelo trecho “Tu é gay que eu sei”. Amigos de longa data, os músicos Nélio Moreno (vocal), Ernani Neves (baixista e vocal), Diamante (violão e vocal), Lúcio Flavio (teclados e vocal) e Ademir Horácio (bateria e vocal) já tocavam há bastante tempo na noite carioca, quando o baixista teve a ideia de montar um grupo onde os componentes usassem roupa cor-de-rosa e cantassem músicas sobre o universo LGBT. Em menos de uma semana, eles compuseram 16 músicas.
O primeiro CD veio em 1999 com 12 canções, e o “Rap do Marcelinho” logo estourou nas rádios, levando o irreverente grupo para os principais programas de TV da época, como Jô Onze e Meia, Xuxa, Raul Gil e até o Fantástico.
Na ocasião, todos questionavam se os músicos eram de fato gays e o GAY BLOG BR fez a mesma pergunta a Ernani Neves: “Apesar de não sermos gays, sempre foi um trabalho que falamos em primeira pessoa, uma situação nossa, era como se fosse uma história nossa. Eu fazia o Marcelinho nas apresentações, era o personagem ali no grupo”, conta o baixista.
A Banda Rosa-Choque durou apenas três anos, com histórico de bastantes shows no eixo RJ-SP-MG. Indagado se deu para ganhar muito dinheiro, o ex-integrante lembra que, na época, logo após a aparição no Fantástico, os empresários superfaturaram as negociações, vendendo shows com preços altíssimos e, consecutivamente, as oportunidades foram minguando.
“Existia uma péssima administração, eles nem eram pessoas do meio. Existia mais ganância, querendo ganhar muito e por conta disso acabou quebrando a firma. Nossa primeira aparição de destaque foi no Fantástico, o telefone do escritório não parou de tocar, e os empresários quiseram vender o nosso show por R$ 40 mil pra cima e isso afastou os contratantes”, lamenta Neves.
Com o fim da banda, cada um seguiu um caminho, mas sem deixar a música de lado. Segundo Ernani, a banda chegou a vender 300 mil cópias, mas os dados oficiais apontam um pouco mais de 100 mil. As perdas não foram somente financeiras; em 2015, o baterista Ademir Horácio faleceu vítima de insuficiência renal.
Neves ressalta que a intenção nunca foi fazer deboche com o refrão “Tu é gay, tu é gay que eu sei”, mas humor, retratando eles e não os outros: “Todas as músicas são tratadas com muito humor, mas um humor bem colocado, não é debochar de ninguém, se você escutar as músicas (…) você vai entender o que eu estou dizendo, e nós tínhamos tudo para ter dado certo”.
Na Le Boy de limousine rosa
Além de ter aparecido em diversos programas de TV, a Banda Rosa-Choque deu o ar da graça no famoso talk-show do Jô Soares quando ainda era no SBT. A princípio, o grupo só cantaria na “canja” final, sendo uma participação musical rápida, porém foi tão impactante a presença no palco que o diretor sugeriu que eles fizessem a entrevista.
O “Marcelinho” da canção só tem boas recordações: certa vez, quando participaram de uma coletiva de imprensa em um hotel no Rio de Janeiro, um repórter da extinta revista Sui Generis os bombardeou com perguntas maliciosas, e distorceu as respostas na hora de publicar, deixando os membros do grupo indignados. A sorte foi que a matéria fez sucesso, segundo Neves.
Outra lembrança inesquecível foi quando o grupo fez um show na extinta boate gay Le Boy em Copacabana, e o dono do local alugou uma limousine rosa para que o grupo chegasse em grande estilo. O público gay vibrou o show inteiro, recorda-se.
Questionado se a Banda Rosa-Choque faria sucesso hoje, o baixista diz não saber imaginar o cenário: “Eu não tenho uma opinião precisa, eu acho que poderia ser bem aceito, a música é leve, tem um conteúdo sutil, é uma pergunta difícil de responder, a Banda Rosa-Choque nasceu quando ‘a mãe da internet estava grávida ainda’. A internet não era da forma como é hoje. Na época, o YouTube nem estava ativo”. E acrescenta: “Mas o que dizer desse tempo que a gente vive hoje, em que tudo é motivo de polêmica, de discórdia?”.
O músico se recorda que, na época, a banda também sofreu discriminação, principalmente para conseguir espaço para divulgação: “Sofremos preconceito na época, como a gente vinha vestido de rosa, às vezes, para chegar até uma rádio era difícil, nós tivemos a coragem, nós assumimos a responsabilidade de pôr um terno cor de rosa, sapato de saltinho e ir para os palcos da vida cantar. E se as pessoas acham isso vergonhoso, eu vejo como arte, eu estava ali no palco e tive a coragem de fazer isso, e nós fomos discriminados por isso”, relembra.
Exceto os casos de preconceitos, o ex-integrante lembra que o público adorava a banda, a ponto de quererem invadir o camarim. “Era todo mundo: hétero, gay, mulheres… fizemos um show numa praça em Duque de Caxias, foi uma loucura, chegaram a rasgar a minha roupa, foi muito legal”.
Ernani Neves não esconde o desejo de voltar com o grupo, ou até mesmo lançar uma versão remix do sucesso e fazer lives relembrando outras canções como “O Bofe”, “Os Liberais”, “Iluminada” e outras tantas que não tiveram o mesmo destaque do “O Rap do Marcelinho”.
A Banda Rosa-Choque está no Spotify, Apple Music e outras plataformas de streaming.