“Me rotulavam de lésbica, maconheira e esquerdista. Isso não me ofendia”, conta Amanda Ramalho em entrevista

A jornalista Amanda Ramalho, que ficou conhecida no programa Pânico, fala sobre transtornos emocionais, sua experiência na rádio Jovem Pan e o seu projeto atual, Esquizofrenóias

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Desde 2018, a jornalista Amanda Ramalho vive um momento especial na sua vida frente ao podcast Esquizofrenóias. A radialista conversa de forma objetiva e espontânea com especialistas da área de saúde mental, um assunto que ela compreende bastante: desde criança Amanda sofre de depressão e ansiedade social e, através do podcast, tem ajudado muitas pessoas que sofrem de transtornos emocionais.

O sucesso do programa rendeu uma indicação ao Troféu APCA na categoria “Podcast” em 2019. Em bate-papo descontraído, Amanda fala sobre os mais diversos assuntos e revela sem dar detalhes que vem novidades por aí.

amanda ramalho

Quando a depressão e ansiedade social surgiram na sua vida, você ainda era uma criança em uma época em que a mídia de modo geral não dava muito atenção ao tema. Sua família teve esse “feeling” de identificar que você sofria de algo que era sério?

Lembro de ter sintomas desde muito nova. Mas minha família achava que eram apenas as minhas características: reservada, tímida, assustada, medrosa, não saía de casa a não ser para ir a escola. Eu tinha medo de morrer tomando banho desde muito pequena. Eu pedia pra que minha irmã (sete anos mais nova) ficasse na porta do banheiro, caso algo ruim acontecesse. Eu devia ter uns nove anos. Com cinco anos eu sentia taquicardia e minha mãe me levou num cardiologista e lógico que eu não tinha nada. Eram crises de ansiedade.

Na adolescência tudo ficou maior e, aos 15 anos, minha mãe me levou numa psicóloga. Passei um ano mentindo apenas para ter alta. Até que um dia falei pra minha mãe que eu não queria mais frequentar a terapia, que era para ela ir na consulta e dizer que eu não queria mais e eu não tinha coragem de falar. Quando minha mãe voltou, ela disse que a terapeuta havia falado que eu tinha depressão profunda e ela não conseguia me falar pois não me conhecia de verdade. Ela disse que eu precisava frequentar um psiquiatra urgente. Foi aí que comecei a me tratar. Isso tem quase 20 anos.

A ansiedade social seria um tipo de fobia de lugares públicos, que faz com que as pessoas evitem o contato social. No entanto, na época do Pânico, você era uma pessoa famosa. Como você lidava com a abordagem das pessoas? Às vezes tocando, abraçando, se aproximando com intimidade enfim…

Claro que não foi fácil, mas eu acredito que se eu não tivesse essa exposição por causa do meu trabalho eu jamais me submeteria a situações como aquelas. Acredito que de alguma forma foi terapêutico. Mas, sim ,eu sofria muito por ter essas características.

Você trabalhou no Pânico durante 15 anos, você considera o humor do Pânico semelhante a um bullying escolar? 

Certamente. Hoje eu não sei como está agora, mas na época que eu estive era meio que isso.

E até a que ponto as zoações dos integrantes do Pânico mexiam com o seu emocional? (Lembro que por diversas vezes eles costumavam pôr no monitor uma foto sua acima do peso e você pedia que eles tirassem a foto da tela, enquanto eles debochavam/riam).

Pois é, isso de zoar a imagem eu nunca lidei bem. Eu trato minha auto imagem até hoje. Não foi algo que começou no programa. Isso é uma parada eu comigo mesma, mas claro que reforçar isso não me fazia bem. Outras coisas não me ofendiam, me rotulavam de lésbica, maconheira e esquerdista em uma época. Isso eu não via como ofensa.

A sua saída do Pânico teve a ver com uma mudança em termos de pauta da rádio, que começou a explorar um outro tipo de posicionamento político?

Sim. O programa que era basicamente de bullying, como você mesmo disse, para se tornar um lugar de debate político era muito pesado, pois eu era a antagonista da opinião do programa. Logo virei alvo de coisas pesadas demais. Bem mais pesadas das que eu estava acostumada.

É verdade que você não acessava as redes sociais do Pânico, para que os comentários dos haters não afetasse o seu emocional?

Sim. Até hoje tenho muitos filtros de palavras. Sei que volta e meia volto a ser xingada mas pouca coisa chega em mim.

Você está à frente do podcast Esquizofrenóias, em que conversa com médicos e pacientes sobre questões envolvendo saúde mental. Creio ser de uma grande responsabilidade falar sobre um tema tão sério e ao mesmo tempo expor episódios pessoais da sua vida particular, não?

Sim, saúde mental sempre foi meu interesse pelo meu histórico de vida. Algo totalmente legítimo. Acredito que eu exponho o suficiente. Existem coisas que eu nunca falei e provavelmente não vá falar sobre mim.

De que forma o isolamento social afetou a sua saúde mental? Ouvi de pessoas “antissociais” que essa reclusão tem sido ótimo para elas, principalmente o trabalho home office.

Somos seres sociais. Ao mesmo tempo que me sinto menos pressionada trabalhando de casa, eu sei que quando o tal do novo normal chegar posso sentir dificuldades de socialização já que não estou exercitando essa parte neste período.

Você acredita que a pandemia fez com que aumentasse os transtornos emocionais, melhor dizendo a depressão nas pessoas?

Eu sei que tem gente que nunca teve contato com esse tipo de sofrimento está sentindo isso pela primeira vez. Pessoas que haviam recebido altas de seus tratamentos voltaram a ter acompanhamento com profissionais.

É possível se curar de uma depressão ou na verdade apenas aprendemos a lidar com ela? 

Eu não gosto do termo “vencer a depressão” a depressão não é algo que deve ser vencida ou combatida, falam isso também. Infelizmente ou felizmente, não sabemos, uma vez que você tem uma depressão está mais apto a desenvolver outras. O que não é necessariamente ruim porque se você tem o tratamento correto, meio que já sabe como funciona o processo e que pode lidar com ele.

No seu ponto de vista, o que pode desencadear os transtornos emocionais além do fator genético? Uma família disfuncional, bullying, relacionamentos abusivos etc.

Tudo isso. Não é só genética, não é só o ambiente tóxico.

Além do podcast Esquizofrenóias, você gostaria de fazer algum outro tipo de trabalho ligado a saúde mental?

Simmm! Em breve poderei falar uma novidade legal sobre isso.

No decorrer dos anos, entre o Pânico na TV e o Esquizofrenóias, a sua aparência mudou bastante, você ganhou peso, deixou os cabelos curtos e os tingiu de loiro durante um tempo. Essa mudança física teve a ver com esses transtornos emocionais?

Na verdade eu me senti mais livre porque não tinha mais a TV e eu podia fazer tudo o que eu queria com meu cabelo. O peso eu desencanei também porque eu não era mais tão vista então eu relaxei com o lance da imagem. Na TV eu criei nóias que eu não tinha antes. Como falei no começo eu lido com problema de imagem desde cedo.

Qual foi o tema mais difícil que você já abordou no Esquizofrenóias? 

Suicídio. Eu sofri uma internação por tentar uma vez. Foi complicado falar disso publicamente porque traz lembranças que não entro em contato com frequência mas eu sabia que era importante falar sobre o assunto.

O que o Esquizofrenoias acrescentou na sua vida além do aprendizado por estar sempre em contato com profissionais da área de saúde mental?

Acho que me tornei mais séria como profissional.

Você considera a fama como algo nocivo a saúde mental quando a pessoa sofre por exemplo de ansiedade social?

Sim.

Já pensou em escrever um livro a respeito da sua experiência à frente do Esquizofrenóias?

Vai rolar.

Você tem muitos amigos gays, você acha que eles são mais propensos a ter depressão em virtude do preconceito da sociedade?

Sim. Porque ser padrão torna você pertencente a grupos com mais facilidade. E a sensação de pertencimento acolhe. O acolhimento é muito necessário mas em muitos grupos parece algo distante.

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