Jeff “The Tank” Ludwig, o primeiro lutador brasileiro de MMA que revelou ser gay

Em entrevista exclusiva para o GAY BLOG BR, o ex-lutador de vale-tudo Jeff Tank Ludwig falou sobre sua saída do armário, a experiência nos tatames e a vida em NYC

Jeff “The Tank” Ludwig pode ser considerado um pioneiro em um dos esportes mais violentos e machistas que existem no mundo: o vale-tudo. O lutador viralizou ao revelar publicamente sua homossexualidade em 2017, quando ainda se chamava Jefferson ‘Tanque’ Silva, ao postar um vídeo de seu casamento com o também lutador Rob Sullivan, com quem está junto desde 2013.

Jefferson ‘Tanque’ Silva Jeff "The Tank" Ludwig
Jeff “The Tank” Ludwig – Reprodução

Natural de Curitiba, hoje Jeff vive feliz em Nova York atuando como consultor físico e personal trainer com enfoque em artes marciais, afinal ele praticou por mais de duas décadas 4 modalidades: Muay Thai, Boxe, Jiu jitsu e Wrestling. A luta nos ringues ao longo de 10 anos é coisa do passado, e hoje ele se dedica ao Crossfit, isso explica a forma física invejável do brasileiro de 1,90m e 115 kg.

Dono de vitórias importantes ao longo de sua carreira, Jeff foi campeão do K-1 Brazil GP e K-1 Brazil MMA e tem no currículo lutas contra a lenda do K-1, o tetracampeão do K-1 Japan, Ernesto Hoost e o duro Canadense Michael McDonald tricampeão do K-1 USA (K-1 e o maior torneio de luta em pé do mundo, seria o UFC da luta em pé). Simpático e sempre bem humorado, Ludwig não descarta a possibilidade de fazer uma carreira no cinema de ação, carisma e habilidades nas artes marciais ele já tem de sobra.

Jeff “The Tank” Ludwig e marido – Reprodução

Como as artes marciais surgiram em sua vida?      

Eu fazia panfletagem para uma academia em Curitiba onde meu mestre dava aulas. Um dia eu assisti uma de suas aulas e pedi se poderia treinar com ele.

Você passou 20 anos praticando quatro artes marciais?  

Na verdade eu completo 25 anos treinando artes marciais esse mês, nesse período eu treinei Muay Thai, boxe, wrestling e Jiu Jitsu.

Jeff “The Tank” Ludwig – Reprodução

Quem te deu esse apelido “Tanque/Tank”? 

Meu mestre Ariel Fernandes, em Curitiba. Sempre fui o maior da turma e mais pesado. Aí, durante os treinos, ele falava que eu passava por cima de quem estivesse treinando comigo. “Esse moleque parece um tanque de guerra lutando”, dizia. Aí ficou Tanque, que acabou virando “Tank” quando comecei a lutar fora do Brasil.

E o MMA como entrou na sua vida? 

Várias academias no Brasil, em 1995, ensinavam “Vale-Tudo Free Style”, mistura de técnicas de várias lutas em pé e de chão que hoje se chama MMA. Então MMA foi minha primeira escola. Minha estreia foi no MMA com 18 anos, quando lutei com Dilson Wakarens, que participou da terceira edição do BBB. 

Jeff “The Tank” Ludwig – Reprodução

E vale tudo mesmo?  

Hoje em dia, a luta se profissionalizou bastante. Com a cobertura da televisão e venda de pay-per-view, muitas regras foram adicionadas. Mas quando comecei só não podia morder e enfiar o dedo no olho. Não se usava luvas e podia dar cabeçada. Alguns eventos até permitiam golpes no genial.

Podemos dizer que você foi o primeiro lutador de MMA que se assumiu gay ?    

Eu acho que sim, não sei se estar aposentado conta (risos), mas como ainda tenho planos de voltar a lutar, podemos dizer que fui o primeiro.

Jeff “The Tank” Ludwig– Reprodução

Você com certeza quebrou paradigmas com essa revelação em um meio bastante machista, talvez até homofóbico. 

O mundo é machista, misógino e homofóbico, não só no meio da luta. Mas, sim, ainda é um tabu ser gay no MMA, tem que ter coragem, tem que ser perseverante e amar a arte pra continuar – ou nunca sair do armário.

Antes da declaração, você se casou muito jovem, aos 20 anos e permaneceu casado durante 8 anos. É verdade que durante esse tempo casado você nunca havia tido desejo sexual por homens? 

Eu vivia numa bolha, vivia literalmente para meus treinos, minha família, esposa e enteada e alunos. Sempre fui focado na minha carreira e só pensava, dormia, comia, bebia e falava em luta. Nunca tive tempo pra pensar ou sentir nada diferente que não fosse minha vontade de ser campeão um dia.

Jeff “The Tank” Ludwig – Reprodução

E como foi esse “despertar” para homossexualidade?                                             

Isso aconteceu quando eu estava com 28 anos, depois de eu ter divorciado de minha esposa, por motivos que não foram a minha sexualidade. O que aconteceu foi que eu estava sozinho pela primeira vez, sem nenhuma amarra e em algum momento eu me permiti explorar algumas ideias que começaram a aparecer na minha cabeça. Como eu saí do meu casamento com PTSD (transtorno de estresse pós-traumático), eu tinha pânico em ter contato com outra mulher, isso acabou abrindo meus olhos pra outra direção. Aí foi quando tudo ficou confuso e eu não sabia mais o que eu era ou o que eu gostava, eu até cheguei a falar com minha ex: “Eu acho que to sentindo atração por homem, eu não sei o que tá acontecendo mas eu acho que sou gay” ela riu e falou: “Você? Gay? Impossível, vamos no médico pra ver o que é isso”. Mas como eu não confiava nela, eu nunca fui a médico nenhum.

Você tem conhecimento de outros lutadores de MMA que são gays mas que não tiveram ainda a coragem que você teve de sair do armário?        

Sim, conheço várias pessoas que são professores, atletas, de faixa branca a faixa preta, lutador amador e profissional que são gays e têm seus respectivos parceiros, mas que mantêm isso privado.

Em 2017, você se casou com o seu companheiro, o americano Rob Sullivan, que também luta Muay Thai. Soube que você o conheceu em 2013 no Rio, como foi esse encontro? 

Rob estava fazendo um tour pela América do Sul e o último lugar que ele visitou foi o Rio de Janeiro. Mas ele não era lutador de Muay Thai, ele praticava Muay Thai, praticou comigo e também treinou na Tailândia um período que ele ficou lá.

Jeff “The Tank” Ludwig – Reprodução

Mas foi durante um treino de luta? 

Eu conheci ele numa festa e foi tudo muito estranho, até porque eu não falava inglês e ele não falava português. Mas logo depois ele foi embora e ficamos falando por WhatsApp e FaceTime. Até quando ele falou que eu deveria mudar pra NYC. E eu decidi fazer as malas e arriscar. Já são sete anos que nos conhecemos, seis anos de New York e quatro anos de casado.

A química rolou de imediato? 

Para que os dois não falarem o idioma um do outro precisou de muita química, né?! (risos)

Frames do vídeo do casamento – Reprodução

Quando você tomou a decisão de revelar a sua orientação sexual, não teve receios de como os seus colegas de “ringue” iriam reagir?                 

Não tive tempo pra pensar, era tudo muito novo, solteiro, mudei de São Paulo para o Rio de Janeiro, ainda assustado, preocupado. O único medo que tinha era que minha família e alunos soubessem e não me aceitassem. Como eu nunca me assumi, nunca tive esse medo na academia ou num ringue, até porque quando me assumi publicamente eu já não estava lutando.

E nem mesmo medo de perder patrocinadores? 

No Brasil, 15 anos atrás não era qualquer atleta que tinha patrocínio. O MMA não era visto como hoje. Então, nunca tive patrocínio.

Soube que você recebeu muito apoio dos colegas de tatame após revelar.

Quando eu decidi postar o vídeo do meu casamento foi quando eu liguei o f***-se. Falei que quem não quisesse aceitar, a porta é a serventia da casa. Então já sabia da repercussão que o vídeo do meu casamento iria causar. Um dia antes do meu casamento eu mandei um email para meus mestres, alunos e parceiros de treino que eu sempre considerei como irmãos. E o retorno foi incrível, recebi frases como: “Quero ver ser homofóbico contigo”, “Vai, chama ele viado”, “Tomar essa decisão mostra que tu é mais macho que muito lutador brabo que entra no ringue aí”. Eu tive 100% de aceitação de todos meus professores, alunos, amigos e principalmente minha família. Do que mais eu poderia ter medo? Só da morte mesmo.

Jeff “The Tank” Ludwig – Reprodução

Atualmente você não luta mais MMA e tem atuado como consultor físico/personal trainer. Nunca pensou em seguir uma carreira no cinema de ação, como vários fizeram, tipo Ronda Rousey, Scott Adkins (que é instrutor de Kickboxing), Bolo Yeung, Jeff Wincott e tantos outros? 

Pois é, eu parei de lutar mas nunca parei de treinar luta. Eu continuei treinando e dando aulas aqui em New York, mas nunca fiz muito barulho até porque estava ilegal. Mas essa ideia de ser ator de filme de ação já passou pela minha cabeça sim, acho que ainda tenho tempo, Morgan Freeman começou a carreira dele depois dos 45 anos (risos). Agora falando bem inglês, se alguém convidar tô dentro.

Jeff Wincott, Bolo Yeung e Scott Adkins (Reprodução)

Creio que quando você era criança, você curtia bastante filmes de ação/luta, quem eram seus ídolos naquela época? 

Pois é, eu era muito bagunceiro e brincava muito sozinho, até porque meus amigos e primos não tinham paciência para as minha maluquices. Eu sempre fui muito ogro desde pequeno (gargalhadas). Sempre gostei de Jaspion, Jiraiya e Changeman. Meu favorito era o Change Griffon (risos).

Atualmente podemos ver vários gays (assumidos ou não) nas artes marciais, inclusive existe um site de origem húngara que reúne lutadores “amadores” do mundo inteiro para disputar combates (às vezes com um teor erótico) em ringues improvisados, além de grupos no Whatsapp com o mesmo propósito. Na sua opinião, a que se deve essa adesão dos gays as artes marciais que sempre foi visto como um esporte “violento e machista”?                                                

O homem gay luta ou pratica arte marcial desde que o mundo é mundo, não é um boom do momento. Em Sparta, ser gay era até incentivado, porque era muito mais perigoso levar um casal pra guerra. Se esse guerreiro perdesse o companheiro ele viria 20 vezes mais agressivo para vingar a morte do seu parceiro. 

Você também fez alguns editoriais de moda, um deles nu para a revista DNA Austrália, um ensaio bastante comentado. Você recebe muitas cantadas pelas redes sociais ou mesmo pessoalmente?                                                      

Acabei virando modelo depois de velho (risos). Estou brincando, modelo nada. Eu recebi um convite de um fotógrafo quando estava me preparando pra lutar esse ano. Foi aí esse ensaio foi pra DNA magazine, depois chegaram outros convites. Acabou que o Covid-19 nocauteou todo mundo e acabei adiando minha volta.

Cantada sempre acontece, o engraçado é que eu recebo mais cantadas de mulher do que de homem. As mulheres mesmo sabendo que sou gay me cantam mais do que quando era “hétero solteiro” e eu adoro (risos). 

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