Em entrevista, Silvetty Montilla fala sobre carreira, noite, pandemia e limites do politicamente correto

Em uma entrevista exclusiva concedida por telefone para o GAY BLOG BR, Silvetty revela sua paixão pelos palcos e o desejo de continuar fazendo o que mais ama

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Diva das noites LGBTQIA+, Silvety Montilla iniciou sua carreira em São Paulo e acabou conquistando o Brasil inteiro ao longo de 33 anos de carreira. Montilla já foi convidada para fazer televisão, teatro e cinema, mas acabou se apaixonando mesmo pelos musicais, quando teve a chance de atuar em Cartola – O Mundo é um Moinho. Talentosa, ela também foi para o stand up comedy, dublou a animação “Super Drags”, escreveu sua biografia, gravou músicas e criou bordões. 

Sem papas na língua, ela fala abertamente sobre a decadência das baladas, faz críticas ao politicamente correto que, segundo ela, “atrapalha a arte” de quem vive do humor debochado. Em uma entrevista exclusiva concedida por telefone para o GAY BLOG BR, Silvetty revela sua paixão pelos palcos e o desejo de continuar fazendo o que mais ama.

Reprodução: Silvetty Montilla

Estamos há meses em isolamento, em que vários artistas da noite estão sem poder trabalhar. Como está sendo pra você esse momento ?

Faz seis meses que eu não trabalho. Antes, trabalhava em shows nas casas noturnas e boates gays em São Paulo, viajava pelo Brasil, fazia stand up e viajava com a minha peça. Tudo parou e os três primeiros meses foram “muito punk”. Tinha medo de não saber o que fazer e o que ia acontecer da vida sem trabalho. Nós [que trabalhamos com a noite e no setor de eventos] fomos os primeiros a serem atingidos e provavelmente seremos os últimos a voltar. Está sendo muito difícil! No mês do Orgulho Gay, em junho, fiz algumas lives remuneradas, mas depois voltei a ficar sem trabalho. Nunca tive medo de correr atrás, fazer minhas coisas. Algumas amigas estavam fazendo rifas e também entrei nessa. Várias pessoas maravilhosas me presentearam com algumas peças, e é assim que ganho algum dinheiro. Só que a minha vontade é poder voltar a fazer o que eu mais amo: estar em cima de um palco.

Antes da pandemia, a noite carioca era considerada decadente devido ao fechamento de várias casas LGBTs. Você notou o mesmo com a noite paulistana? 

Como disse antes, não sei para onde a cena gay vai caminhar ou se as casas noturnas vão parar. Eu torço muito para que não, pois comecei na noite LGBT e quero poder terminar nela. Lógico que abri o meu “leque”: fui ao teatro, fiz stand up, participações em programas de televisão, cinema e musicais. São coisas que eu quero continuar fazendo, mas adoraria que a noite desse uma “repaginada”. Eu já tive altos e baixos, só que hoje, nessa época em que vivemos [de pandemia], só vejo “baixo”. 

Reprodução Silvetty Montilla

A que se deve essa decadência da noite LGBT?

Falando por São Paulo, eu tive épocas em que cheguei a trabalhar em 9 casas por noite em um sábado. Nos últimos tempos se restringiam a 4 boates: Tunnel – a boate mais antiga de São Paulo, que tem 28 anos; Danger, localizada perto do metrô Santa Cecília; Yacht Club que eu faço de 15 em 15 dias, e a Blue Space, conhecida pelos shows de drags. São Paulo sempre foi vista como a capital dos shows e baladas, mas “caiu” bastante. Acho que isso acontece porque antigamente as pessoas iam para a boate ver um show, beijar, namorar e conversar. Hoje em dia, pelo que vejo, em primeiro lugar está a droga, em segundo lugar a droga também e em terceiro lugar, a droga. Assistir um bom show e a arte de alguém não é mais prioridade para ninguém. 

Você e a Nany People estão entre as personalidades LGBT mais conhecidas e bem sucedidas do Brasil. Você nota muita competição neste meio ou até mesmo “puxadas de tapete”?

Eu fico feliz com o comentário (risos) e acho que a Nany pode ser [uma das mais bem sucedidas], mas eu, em si, não sei dizer. Eu não sou aquela pessoa de me tachar. Sei que estou há 33 anos trabalhando sem parar e sempre trabalhei muito. Competição existe em todas as áreas, especialmente no nosso meio, onde vemos pessoas que deveriam ficar felizes com nosso sucesso e acabam se incomodando. Isso me entristece. Creio que nosso meio não é tão unido quanto poderia ser. 

Reprodução Silvetty Montilla

O seu trabalho envolve interação com o público com muito bom humor, mas existem drags que apenas dublam. Ainda há espaço para as que só fazem lip-sync?

O meu trabalho é diferenciado, mesmo que não seja a única a fazer o que a gente chama de “plateia” [interagir com o público]. Um talento nesse sentido foi a Rose Bombom (já falecida), além da Nany People, que hoje “pulou” para um outro patamar. A Nany não trabalha mais com casas noturnas, mas já trabalhou muito e eu estive com ela em várias oportunidades. A questão da dublagem eu acho linda, e as drags são talentosíssimas. Já que além de sincronizar o movimento da boca com a música, precisa de uma boa interpretação. Hoje em dia o que vemos mais são cantoras drags: a Pabllo, que é a maior referência que temos na cena LGBTQI+, e a Gloria Groove, só para citar algumas. 

Silvetty Montilla e Pabllo Vittar – Reprodução

Recentemente, a veterana drag carioca Lorna Washington foi tema de um documentário. Já trabalharam juntas?

Lorna Washington é uma referência e também um talento nato. Sempre a reverencio quando a vejo porque ela é de uma perfeição e uma técnica que chega a ser “uma aula” para qualquer drag. Já trabalhamos juntas em uma extinta boate localizada no Ibirapuera chamada “Gents”. Recentemente, fizemos uma live juntas e foi maravilhoso.

Em 2012, você concorreu a uma vaga na câmara de vereadores de São Paulo pelo PSOL, sendo a terceira pessoa mais votada do partido, obtendo quase cinco mil votos; porém, sem conquistar a vaga. Você tem planos de tentar novamente a carreira política?

Política nunca foi o meu forte. Eu tive uma amiga, que na época se identificava como um homem gay e hoje é uma mulher transexual, chamada Abigail, que fez esse convite. Quando eu me candidatei ao cargo de vereadora pelo Estado de São Paulo eu não tinha dinheiro, não tinha santinho, não tinha horário político e não fiz divulgação. Um mês antes das eleições, eu estava na Europa, mas tudo isso foi dito quando eles me convidaram para sair como candidata. Eu falei a verdade: que não era a minha meta, não era o meu sonho, não era a minha vontade. Então, eu acho que eram 113 candidatos a vereador e fiquei como segundo suplente, além de ser a terceira mais votada. Foi bem legal, porque se eu tivesse me empenhado realmente, corrido atrás, tivesse feito campanha, eu acho que daria até pra ter entrado como vereadora. Por outro lado, eu acho que tudo vem na hora certa. Nunca foi algo que almejei, mas acho que as pessoas podiam abrir um pouco mais os olhos para candidatos LGBTQIA+. Nós precisamos de representantes.

Reprodução

Você já fez TV, cinema e teatro, migrar dos palcos das boates gays para estas três áreas foi uma forma de diversificar o seu trabalho quando a noite LGBT começou a dar “sinais de cansaço”?

Sair dos palcos das boates, saunas, bares e ir para o teatro, cinema e programas de TV foi muito bom. Foi o reconhecimento do meu talento. Fico muito feliz e tive convites para participar de coisas maravilhosas, e isso pra mim é muito gratificante. Não é pela questão que a cena (deu sinais de cansaço); porque eu fiz todos esses trabalhos no auge da minha carreira, quando ainda tinha muitas casas noturnas. Os convites, quando vinham, eram sempre muito gratificantes, sendo que recentemente amei fazer o musical Cartola – O Mundo é um Moinho, que para mim foi um divisor de águas. Eu amei ter feito, sempre viajei pra fora do Brasil, sempre vi muitos musicais e depois, quando participei de Cartola, eu vi que é uma coisa que também quero para minha vida.

Como surgiu o bordão “Quem pode, gasta, quem não pode, me olha”?

Eu não sei. Sempre teve vários bordões: e aí tá ótimo, tô adorando, alguém comia, coisa boa pra você. São coisas que a gente fala no dia a dia, mas eu acho que é a forma a qual eu coloquei isso no palco e ficava batendo sempre nessa tecla. Acabou “pegando”. As coisas surgiam, eu colocava no palco, eu via que dava certo. Por isso, há bordões que “stão aí até hoje.

O Brasil está vivendo um momento bastante delicado. Termos que eram comuns no passado hoje são considerados ofensivos. Você acha que está havendo um vitimismo? 

Falando por mim, Silvety Montilla, acho que [o mundo] está muito chato. Está muito chato trabalhar, está muito chato fazer certas coisas, muito “politicamente correto”. Eu acho que se fosse na época dos Trapalhões, de Viva o Gordo, estariam todos presos. “Qualquer coisa” é gordofobia. A gente está alí [em um show] tentando tirar o riso de alguém, brincar com a situação do momento, pegar o “timing”. Então, se policiar demais e não poder brincar com certas coisas é algo que atrapalha muito. 

Reprodução Silvetty Montilla

Na sua opinião, o que a noite LGBT tem de melhor e de pior?

Eu, Silvetty Montilla, não saberia dizer os pontos bons e ruins, mas acho que há momentos. Hoje não temos mais esse cenário devido ao covid. mas como disse antes, há sempre “altos” e “baixos”, e eu tive muitos momentos maravilhosos e posso dizer que tive mais momentos bons do que ruins. Só que eu não saberia pontuar quais foram os piores e melhores. Eu só espero que a gente possa voltar nessa nova vida, nesse novo ciclo, a fazer o que a gente ama, o que a gente gosta. Eu amo estar nos palcos, independente de ser nas boates gays, no teatro ou em casas de stand up. Eu queria poder voltar a trabalhar e fazer aquilo que eu mais amo.

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