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A quinta edição do Festival de Cultura Queer en Español, realizada entre os dias 19 e 25 de novembro em Londres, dedicou sua programação ao exame das marcas deixadas pela repressão a pessoas LGBTQ+ no período franquista espanhol. O encontro, realizado no Instituto Cervantes da capital britânica, reuniu pesquisadores em torno de arquivos pouco explorados, relatos pessoais e análises sobre os mecanismos de controle institucional impostos à dissidência sexual ao longo do século XX.

Antonio Casado Rigalt, Nuria Capdevila-Argüelles, Sara Torres, Jorge Gárriz e Víctor Ugarte Farrerons - Divulgação
Antonio Casado Rigalt, Nuria Capdevila-Argüelles, Sara Torres, Jorge Gárriz e Víctor Ugarte Farrerons – Divulgação

O painel de encerramento, intitulado Los legados del franquismo para la comunidad LGBTQ+, foi apresentado por Jorge Gárriz, diretor do festival, e Víctor Ugarte, diretor do Instituto Cervantes de Londres. A mediação ficou a cargo de Iago Mora Arcas, representante da Sociedade de Pesquisadores Espanhóis no Reino Unido (SRUK/CERU), que destacou o apagamento contínuo de memórias queer mesmo após o fim do regime. “Lidar com a história queer implica enfrentar não só a repressão franquista, mas também sua continuidade: tentativas de apagar essas vidas mesmo cinquenta anos depois”, afirmou.

primeira manifestação do Orgulho Gay realizada em Madri em 28 de junho de 1978 - Divulgação/EFE
primeira manifestação do Orgulho Gay realizada em Madri em 28 de junho de 1978 – Divulgação/EFE

Moisés Fernández Cano, autor de uma tese sobre intimidades queer no Madrid franquista, chamou atenção para a escassez de registros oficiais sobre relações entre mulheres, embora as evidências da repressão estivessem presentes em outras formas de vigilância e punição. Um dos casos apresentados envolvia uma mulher expulsa de diferentes conventos sob acusação de “lesbianismo grave”. Posteriormente, ela e uma companheira estabeleceram uma falsa ordem religiosa em Madrid, com sede, capela e respaldo eclesiástico. O episódio, revelado após a ruptura da relação, ilustra as estratégias de sobrevivência adotadas por indivíduos que escapavam do padrão normativo.

Daniela Ferrández Pérez, pesquisadora da Galícia, apresentou documentos pertencentes ao artista Manolito Soler, ativo durante o franquismo em cidades como Vigo, Barcelona e Havana. O material, localizado recentemente, inclui registros de apresentações artísticas em batalhões disciplinares no Marrocos, além de imagens e recortes que remontam à sua trajetória como artista de variedades. “Manolito Soler foi muito mais que uma vítima: foi uma pessoa com agência, que viveu abertamente como queer em um tempo em que isso era quase impossível”, afirmou a pesquisadora.

Primeira manifestação LGBTI realizada na Espanha em 1977 - Divulgação/EFE
Primeira manifestação LGBTI realizada na Espanha em 1977 – Divulgação/EFE

O autor e ex-diretor de políticas de diversidade nas Ilhas Canárias, Víctor M. Ramírez, concentrou sua intervenção na forma como o regime articulava religião, psiquiatria e punição estatal para controlar comportamentos considerados desviantes. Recordou a reforma da Lei de Vagos e Malandros em 1954, que passou a enquadrar a homossexualidade como perigo social, resultando em internações em colônias agrícolas e centros de reeducação. A Colônia Agrícola Penitenciária de Tefía, em Fuerteventura, foi um dos exemplos citados, com base em relatos de ex-internos submetidos a trabalho forçado e disciplina punitiva.

A discussão também abordou o destino de figuras como Laura Frenchkiss, Carmen de Mairena e Encarnita Duclán, cujos arquivos pessoais foram descartados ou destruídos após suas mortes. Segundo Mora Arcas, os casos revelam o desinteresse institucional em preservar a memória de pessoas trans e travestis, mesmo quando reconhecidas em vida como figuras públicas. “A fragilidade da memória queer não é acidental, mas parte de uma estrutura de apagamento sistemático”, concluiu.

Mikel Alonso, do livro “La calle es nuestra – La transición en el País Vasco (1973–1982)” - Divulgação
Mikel Alonso, do livro “La calle es nuestra – La transición en el País Vasco (1973–1982)” – Divulgação

Além das mesas de discussão, a edição deste ano prestou homenagem à artista Perla Zuñiga, com a exibição de um vídeo inédito de sua participação na edição inaugural do festival, em 2021. A programação também incluiu atividades literárias, apresentações cênicas, ciclos de cinema e mesas de análise histórica, com presença de nomes como Sara Torres, Daniel Saldaña París e Ángelo Néstore.

Primeira Marcha do Orgulho Gay na Espanha - Divulgação
Primeira Marcha do Orgulho Gay na Espanha – Divulgação

Ao longo de cinco anos, o Festival de Cultura Queer en Español tem reunido nomes ligados à produção cultural e acadêmica da diáspora hispânica LGBTQ+. Sua realização conta com o apoio de instituições públicas e entidades culturais, entre elas o Instituto Cervantes, a Embaixada da Espanha no Reino Unido e o programa Hackney Pride 365.

Jorge Gárriz, diretor do festival, observou que o evento tem se estruturado como um espaço de reconhecimento e troca entre pessoas queer de diferentes origens. “Em um contexto de migrações e pluralidade cultural, o festival tece redes de apoio, solidariedade e pertencimento”, afirmou.

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