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Carol Lima (PSOL), de 43 anos, é candidata a deputada federal na Bahia. Professora universitária, ela é bissexual e mora em Porto Seguro (BA). Formada em História, a candidata tem mestrado em História Regional e Local e doutorado em Ciência Sociais.

Carol Lima, candidata a deputada federal pelo PSOL da BA (Foto: PSOL/ Barreiras)

Filiada ao PSOL desde 2006, Carol construiu diversas campanhas e candidaturas, mas eu não se via no lugar de candidata. “Desde os 14 anos atuo no movimento popular, ingressei no Grêmio estudantil no ensino médio e tive minha primeira experiência no movimento estudantil. Ao entrar na Universidade comecei minha trajetória militante na esquerda, no feminismo e na luta pelos direitos da população LGBTQIA+”, conta.

“[…] Entendi a necessidade de estarmos disputando os espaços de poder, e pela primeira vez me candidato num processo eleitoral e numa conjuntura marcada pelo ódio a nós, por sermos quem somos. E agora é ocupar tudo e defender as nossas bandeiras e pautas, na construção de um país menos violento e mais democrático”, acrescenta a candidata.

Entre suas propostas, ela enfatiza que o país não terá avanços sem antes revogar contrarreformas que inviabilizam qualquer proposta. Além disso, ela diz que votará e lutará “pela permanência da legislação que garante a política de cotas, a Lei 12.711/02, e a sua ampliação, pois a mesma não garante cotas para a população LGBTQIA+, nem para a população cigana, por exemplo”.

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A candidata ainda salienta que, a população de “derrotar Bolsonaro nas ruas e nas urnas” e elegermos um Congresso Nacional e Assembleias Legislativas diverso e que defendam um programa democrático e popular.Eu acredito que podemos e sabemos que juntes faremos de 2022 o ano do declínio do bolsonarismo! É por nossas vidas! Na Bahia vamos mudar a cara do Congresso!”, reforça Carol, que conversou com o Gay Blog BR para o especial “Eleições 2022“.

Carol Lima (Foto: Reprodução)

Confira na íntegra a entrevista com Carol Lima

GAY BLOG BR: Qual a sua formação e trajetória profissional?

Carol Lima: Eu terminei o ensino médio em 1997, fui do Grêmio estudantil. Retomei os estudos em 2004 e passei no vestibular, entrando na graduação no mesmo ano. Minha formação é em História (Unijorge/2007), com Mestrado em História Regional e Local (UNEB/2010) e Doutorado em Ciência Sociais (UFBA/2020).

Para continuar os estudos precisei fazer todo o tipo de trabalho, faxina, babá, vendedora de loja, na graduação fui beneficiária do FIES e trabalhei no MC Donald’s. No final do curso consegui passar numa seleção de um projeto de pesquisa sobre o MPM (Ministério Público Militar) e desde então me dedico a vida acadêmica, considerando as questões de sobrevivência inclusive, pois tive filho aos 18 anos e minha formação passou pelo amor aos meus filhos(a), aos estudos e a necessidade de ter melhores condições para disputar espaço no mercado de trabalho.

Minha família sempre foi muito pobre, hoje somos menos pobres porque tenho um emprego público. Além disso, é marcadamente conservadora, evangélica e isso me incentivou a construir a vida profissional com o objetivo de ter um lar para mim e meus filhos. O combustível para permanecer no ambiente universitário foi a sobrevivência. Não tinha outra coisa que me tirasse da instabilidade financeira, alimentar e de um ambiente opressor que não fosse os estudos.

E fui estudar o cangaço e as cangaceiras, desde 2006 essa é a minha cachaça. Foi pesquisando história e cinema, para pensar as representações sociais construídas sobre o movimento do cangaço e sobre as cangaceiras, pensando nas relações de gênero e raciais. Minha monografia, minha dissertação e tese passam por essa temática, hoje estou pesquisando Mulheres e Sindicato, pensando na atuação de professoras da base do ANDES-SN na Bahia.

Profissionalmente minha vida se estabiliza quando passo no concurso, em 2011, da Universidade do Estado da Bahia. Antes disso, trabalhei em diversas escolas, no CETEB, na FTC, na UNIFACS e cursinhos comunitários. Hoje sou professora Assistente (na fila da promoção para adjunta) em regime de Dedicação Exclusiva da UNEB. Minha vida profissional é marcada pela esperança, melhor pelo esperançar! 

GB: O que a motivou a se candidatar?

Carol: Sou filiada ao PSOL desde 2006, construí diversas campanhas e candidaturas, mas eu não me via nesse lugar de candidata. Desde os 14 anos atuo no movimento popular, ingressei no Grêmio estudantil no ensino médio e tive minha primeira experiência no movimento estudantil. Ao entrar na Universidade comecei minha trajetória militante na esquerda, no feminismo e na luta pelos direitos da população LGBTQIA+.

Contudo, as condições materiais e da realidade dura da vida, ser mãe e sozinha, ser bissexual numa família conservadora, não ter estabilidade profissional me afastaram dos espaços institucionais e da vida pública, mas dos espaços de direção, fui dirigente do Centro Acadêmico de História, fui dirigente do coletivo estudantil que construí na época, assumi tarefas em coordenações de campanha do PSOL, e quando entrei no movimento sindical, fruto do meu ingresso como docente na UNEB, percebi que os espaços públicos são violentos para nós mulheres, para nós mulheres negras, não incluem mães e pais, e são duros e preconceituosos com a população LGBTQIA+. 

Foi na luta pela paridade de gênero no ANDES-SN, na construção de campanhas dentro das Universidades de combate ao assédio moral e sexual, na construção de ações formativas e de defesa de uma educação laica, diversa, 100% pública com uma perspectiva antimachista, antirracista, antilgbtfóbica e anticapacitista que entendi a necessidade de estarmos disputando os espaços de poder, e pela primeira vez me candidato num processo eleitoral e numa conjuntura marcada pelo ódio a nós, por sermos quem somos. E agora é ocupar tudo e defender as nossas bandeiras e pautas, na construção de um país menos violento e mais democrático.   

GB: Quais os desafios enfrentados ao ser uma candidatura abertamente LGBTQ+?

Carol: A contestação da nossa capacidade de assumir um cargo público no Congresso nacional ou na Assembleia Legislativa, como se o fato de sermos LGBTQIA+ nos limitasse a pensar apenas nas pautas específicas, como se não soubéssemos o impacto da Reforma Administrativa (PEC 32) nas nossas vidas, da Reforma Trabalhista e de tantos ataques aos nossos direitos, como se não fôssemos propositivas ou não tivéssemos um projeto ou programa político.

Tem a questão racial também, não somos as figuras públicas, ou melhor, o modelo de figuras públicas no espaço institucional construído há séculos. Somos a contra hegemonia.

GB: Quais são as suas principais propostas? Há pautas exclusivamente para LGBTQ+?

Carol: Nosso país está destroçado. Não teremos avanços sem antes revogar contrarreformas que inviabilizam qualquer proposta, nossa candidatura defenderá a partir disso: Revogação da EC 95, que congelou os investimentos públicos por 20 anos, e hoje inviabiliza as políticas públicas e os serviços públicos; Revogação da Reforma trabalhista, hoje a população LGBTQIA+ se encontra em subempregos, sem políticas de emprego e renda e isso é consequência dessa reforma; Votar e lutar pela permanência da legislação que garante a política de cotas, a Lei 12.711/02, e a sua ampliação, pois a mesma não garante cotas para a população LGBTQIA+, nem para a população cigana, por exemplo; Proposição de PL que garantam a Justiça Reprodutiva; Programa de Renda Mínima para a mulheres chefes de família, população LGBTQIA+, considerando o recorte racial em situação de vulnerabilidade; Construção de ações em conjunto ao Ministério da Educação de inclusão nos currículos escolares e da educação superior conteúdos que tratem das relações de gênero e sexualidade; Ações formativas no combate a violência contra as mulheres (Cis e Trans), em conjunto com as Secretarias de Políticas para as Mulheres nos estados e municípios; Defesa de ampliação a nível nacional de atendimento nas DEAM de 24h, e não mais em horário comercial; Apresentar Projetos de Leis que garantam a vida, emprego e renda a população LGBTQIA+, não pode caber apenas ao STJ ações que nos projetam.

GB: Quais medidas você acredita serem necessárias para combater a LGBTfobia?

Carol: Não podemos reduzir o combate apenas com ações punitivistas. A criminalização da LGBTfobia não garante nossa proteção, apenas criminaliza a ação e isso é insuficiente. O encarceramento não é a solução, ela tem um impacto imediato e não estando associado a um processo formativo, a uma educação que pensa as relações de poder a partir dos debates de gênero e sexualidade, o machismo e a cultura do estupro como prática corretiva serão ainda as marcas da violência contra nós.

Combater a LGBTfobia passa pela mudança estrutural da sociedade, e isso não se faz apenas com o encarceramento ou com punição, passa pela defesa de um programa democrático e popular, de uma mudança do sistema político e econômico que nos impõe a violência como forma de nos manter “normais” e a “ordem”. Uma educação libertadora e a garantia de políticas públicas para a população LGBTQIA+ contribuirá  para mudarmos essa estrutura que nos oprime.

GB: O que você pensa sobre o uso e políticas da PrEP?

Carol: É uma política pública instituída a partir de 2018, que tem como base tratamento a partir de medicamento que reduz as chances dos(as) usuários pegarem uma infecção proveniente do HIV. A PrEP é fundamental para os avanços em vacinas contra o HIV/AIDS.

Como pesquisadora vou partir das contribuições da FioCruz, da UFRJ e da USP que apresentaram alguns resultados sobre o uso do PrEP: redução de 90% de contrair HIV. Um dado muito bom, essa medicação é indicada para as pessoas que tem uma maior probabilidade de pegar a doença, o perfil dessas pessoas: que não usam preservativo nas relações sexuais.

É fundamental o uso dessa política e as pesquisas são necessárias, mas me preocupa investirmos na medicalização das pessoas e não em campanhas de educação sexual, que trate da preservação da vida e do combate as DST, porque o HIV não é a única DST existente no mundo. E a gravidez indesejada? Sem uma política que garanta a justiça reprodutiva, qual o impacto do não uso de preservativos na vida das mulheres Cis e dos homens Trans?

O uso do PrEP de forma indiscriminada e sem espaços formativos sobre a importância do uso de preservativos, sem educação sexual e sem considerar as relações de gênero, que são relações de poder, o perfil dos(as) dependentes dessa medicação irá mudar: serão pessoas que não usaram preservativo, que são pobres, que são mulheres ou homens trans.

É necessário defender as campanhas de prevenção ao HIV/AIDS e outras DST, com o uso de preservativos, principalmente entre a juventude. Prevenir ainda é melhor que medicar. Precisamos que o Estado garanta uma mediação entre a medicalização e as campanhas preventivas.

Não estou dizendo que a FioCruz, a UFRJ ou a USP defendem isso, mas de 2016 para cá houve uma desestruturação das políticas de prevenção às DST e HIV/AIDS, o governo Bolsonaro cortou o orçamento, desmontou o programa de referência internacional de controle e combate ao vírus no país! O programa brasileiro de combate à disseminação do vírus HIV, sofreu intervenções do atual governo. Por meio de um decreto assinado pelo presidente Jair Bolsonaro, pelo ministro da Economia Paulo Guedes e na época pelo ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, o nome do Departamento de Vigilância, Prevenção e Controle das Infecções Sexualmente Transmissíveis, do HIV/Aids e das Hepatites Virais foi alterado para Departamento de Doenças de Condições Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis, rebaixando a área de HIV/Aids a uma coordenação. Ou seja, secundarizou e inviabilizou ações de combate e prevenção com as IST e HV. 

E a justificativa do Presidente foi Lgbtfóbica e discriminatória. Não podemos ficar dependendo de Governo, precisamos aprovar projetos de leis que protejam a política pública. A PrEP precisa estar conectada com campanhas do SUS de prevenção e o uso de preservativo, a campanha fomentará espaços formativos e distribuição de material didático e poderá contribuir no combate também da LGBTfobia.

GB: Como você avalia o governo de Bolsonaro?

Carol: Genocida. Misógino. Um neoliberal conservador, fascista e autoritário. Ele e seu governo foram responsáveis pela morte de minha mãe e do seu irmão, meu tio, que foram vítimas da Covid e de sua política negacionista.

Mas, esse governo tem uma base no congresso nacional que o mantem, pois garantiu contrarreformas que só beneficiou o mercado financeiro. Desde 2016 nós não temos um minuto de paz, é só retrocesso, derrotar esse governo é a nossa principal tarefa.

Confira a lista de candidaturas LGBTQIA+ de 2022 neste link.

Lista de candidatos LGBTQ+ nas eleições 2022 | Deputados, Senadores, Governadores




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Jornalista gaúcho formado na Universidade Franciscana (UFN) e Especialista em Estudos de Gênero pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM)