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Professora e bióloga, Maya Eliz (PSOL), de 23 anos, disputa uma vaga como deputada federal no Ceará.  Mulher trans e bissexual, ela é moradora de Fortaleza, capital cearense. A candidata também é mestra e doutoranda em Educação.

De acordo com a Maya, sua candidatura foi motivada “a partir de um entendimento coletivo” em “termos de uma representação da juventude LGBTQ+, […] considerando a necessidade de apresentação de mulheres trans, professoras e de jovens nas casas legislativas que ainda são tão pouco representadas”.

Queremos propor um debate com a sociedade, de uma construção de uma nova política transformada e transformadora, no sentido de entender que essa política que já está estabelecida – das grandes elites, dos homens, cis, héteros, brancos -, ela não nos vê”, afirma a candidata.

Maya parte de três eixos para pensar políticas públicas em sua candidatura: a vida e os direitos da população LGBT+, o direito e acesso à educação pública com qualidade e os direitos da juventude, como cultura, lazer, esporte e também empregabilidade. A candidata, é uma das entrevistadas da semana no especial “Eleições 2022” do Gay Blog BR.

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Maya Eliz, candidata a deputada federal pelo PSOL do CE (Foto: Divulgação)

Confira na íntegra a entrevista com Maya Eliz

GAY BLOG BR: Qual a sua formação e trajetória profissional? 

Maya Eliz: Eu sou formada em licenciatura em Ciências Biológicas pela Universidade Federal do Ceará, mestra e doutoranda em Educação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. E tenho colocado como prioridade trazer para atuação em escolas do ensino fundamental, prioritariamente, tanto por escolas da rede privada, mas também escolas da rede pública, atualmente eu sou professora substituta da rede municipal de ensino de Fortaleza, atuando prioritariamente nas séries de oitavo e nono ano como professora de Ciências. No campo da pós-graduação eu realizo pesquisas relacionadas ao corpo, ao gênero, sexualidade, nos espaços escolares de modo geral, tanto pensando a escola e a universidade, tudo a partir do campo do currículo e do ensino de ciências.

GB: O que a motivou a se candidatar? 

Maya: Essa candidatura é motivada a partir de um entendimento coletivo da organização que eu construo, dentro do partido ao qual eu sou filiada, de termos uma representação da juventude LGBTQ+ que possa materializar as nossas pautas e as nossas lutas cotidianas nos espaços que nós construímos, considerando a necessidade de apresentação de mulheres trans, professoras e de jovens nas casas legislativas que ainda são tão pouco representadas. Então, considerando esses espaços e essas materializações de identidade em meu corpo, sendo eu uma mulher trans, travesti, professora, estudante, pesquisadora e jovem nós queremos propor um debate com a sociedade, de uma construção de uma nova política transformada e transformadora, no sentido de entender que essa política que já está estabelecida – das grandes elites, dos homens, cis, héteros, brancos -, ela não nos vê,  e nós, além de sermos vistas, nós queremos falar e pautar as nossas políticas e construir políticas públicas que nos entendam e que nos incorpore na garantia de direitos e na garantia de cidadania

GB: Quais os desafios enfrentados ao ser uma candidatura abertamente LGBT+? 

Maya: Os desafios de ser uma candidata bissexual e travesti, eles se materializam como os desafios do cotidiano, sobretudo considerando o atual cenário brasileiro onde a disputa presidencial está muito polarizada e nós temos aí um candidato abertamente LGBTfóbico, abertamente machista, misógino, racista, enfim, que engloba diversas as opressões sociais contra as minorias, a gente tem certos receios, a dificuldade de chegar em alguns espaços com tranquilidade, sem medo de sofrer algum tipo de agressão, estar nas ruas é sempre um momento de alerta, porque nós estamos ali apresentando nosso candidatura, apresentando nossas propostas, nossas ideias, nosso material e é sempre possível que nós possamos sofrer algum tipo de agressão, então a gente sempre busca andar em coletivo, em grandes grupos para que tanto eu enquanto candidatura, o corpo que materializa-se em candidatura, mas também a galera da equipe, as pessoas da equipe que compõem essa candidatura, não soframos qualquer tipo de agressão, mas também para além dessas condições, o cenário, a própria ideia das pessoas desacreditarem numa candidatura de uma jovem travesti, cria da periferia, porque uma vez que esses corpos são pouco vistos nos espaços de deliberação, espaços de poder, esses corpos ainda não são credibilizados como corpos possíveis pra construção da política e da representação democrática, então esse também é esse espaço do convencimento, das pessoas acreditarem que ter uma travesti deputada federal, eleita por um estado do nordeste ainda é difícil fazer esse convencimento, mas estamos aí nas ruas e nas redes todos os dias querendo mostrar que nós viemos e porque essa candidatura ela é significativa e como ela pode transformar tudo isso que está aí.

GB: Quais são suas propostas? Há pautas exclusivamente para LGBT+? 

Maya: Nossa candidatura tem três eixos, três pilares de onde ela parte para pensar as políticas públicas que nós queremos debater caso sejamos eleitas lá no Congresso, queremos estar aí propondo um projeto que englobem esses três eixos. Os três eixos são: a vida e os direitos da população LGBT+, o direito e acesso à educação pública com qualidade e os direitos da juventude, como cultura, lazer, esporte e também empregabilidade. Então, nós nos centramos aí num projeto em que pense, principalmente, a partir desses três eixos para que a gente possa propor políticas públicas que sejam aprovadas no Congresso e que tenham validade legal permanente, em formas de leis, que garantam o nome social, e garanta o direito ao uso do banheiro, que casos de LGBTfobia, sejam investigados por um processo, por Delegacias Especializadas, nesse sentido, que educação pública tenha mais investimentos concretos e reais e que a gente também seja um processo de fiscalização do governo federal, que a gente não seja mais surpreendidos por escândalos como o que ocorreu no MEC, no último período, mas também entendendo que essas pautas perpassa pelo nosso terceiro eixo que é o eixo da juventude, mas entendendo que a juventude também precisa, assim como a população LGBT, sobretudo os corpos travestis, precisam que a gente debata a empregabilidade, que a gente debata condições de acessar esse mercado de trabalho, a partir de capacitação, a partir de formação, a partir de uma educação de qualidade em que garanta e que esteja disposta a fazer o enfrentamento contra as opressões e que isso garanta a permanência das pessoas LGBTs, sobretudo trans e travestis no espaço escolar, para que os índices de expulsão escolar desses corpos diminuam. Então, nesse sentido, nossas propostas se encaminham sempre pensando nesses três eixos: educação, a vida das LGBTs e a vida das juventudes, porque nós precisamos ainda avançar muito nas políticas dessas pessoas, nas políticas de assistência e nas políticas de garantia desses direitos que deveriam ser direitos já assegurados há muito tempo. Então no nosso eixo, exclusivo para pensar as políticas LGBTs, nós temos aí pensar o processo de escolarização, mas também mercado de trabalho, bem como segurança e saúde, nossos atendimentos de saúde eles precisam estar capacitados para atender a comunidade LGBT de modo geral, bem como a segurança precisa também entender o que são os casos de LGBTfobia, como caracterizá-los e como lidar com situações como essas na defesas das vítimas, no acolhimento das que sofreram algum tipo de agressão.

GB: Quais medidas você acredita serem necessárias para combater a LGBTfobia? 

Maya: A pauta de LGBTfobia tem uma central na nossa candidatura e a gente acredita que para isso, esse combate perpassa principalmente por investimento em educação anti LGBTfóbica, nos espaços formais de educação, mas também em outros, com capacitação das pessoas que trabalham com atendimento ao público ou que trabalham em espaços de grande circulação de pessoas, perpassa também pela fomentação de políticas públicas que garantam acesso das pessoas LGBTs ao mercado de trabalho e aos espaços de modo geral, também que a gente consiga caracterizar o que são os crimes de LGBTfobia, como eles são executados, como eles se materializam, bem como o acolhimento das vítimas LGBTfobia nos espaços de segurança, como delegacias, a gente entende que a necessidade de delegacias especializadas aos crimes de LGBTfobia é urgente para que nós tenhamos profissionais capacitados a lidar com isso e que possam fazer capacitações públicas, para que a gente consiga avançar nessa luta pelos direitos da população LGBT.

GB: O que você pensa sobre o uso e políticas da PrEP? 

Maya: Quanto ao uso da PrEp, eu acredito que uma iniciativa de saúde pública muito positiva para casais sorodiscordantes, pessoas que trabalham no ramo sexual, ainda a disponibilização como política de distribuição, disponibilização da PrEP, ainda carregada de alguns estigmas, estereótipos fruto da pandemia de AIDS e contaminação por HIV, na década de oitenta, início na década de noventa, que eu considero, inclusive, como um grupo de risco gays e homens que fazem sexo com outros homens, nesse sentido a gente precisa avançar, entender que a a AIDS não é uma doença que afeta somente esse público e que muitos heterossexuais também são contaminados com o vírus, para além disso o uso da PrEP não pode ser uma justificativa pra diminuição, pro incentivo do não uso do preservativo, da camisinha, porque a gente precisa considerar ainda a existência de outras infecções sexualmente transmissíveis que este medicamento, esse tratamento não vai conseguir dar conta, então a gente hoje, por exemplo, diversos são os casos e tem aumentado o número de casos de infecções por ISTs: sífilis, gonorreia, sobretudo a sífilis por conta do não uso do preservativo, principlamente na juventude que tem aí ouvido o falso discurso e estado ou disseminado uma falsa ideia de que as infecções sexualmente transmissíveis são coisas do passado. Então, acho que precisa também que haja maior conhecimento da população sobre a existência da PrEP, mas que esse maior conhecimento, essa disponibilização dessa política de assistência, de saúde, ela seja também trabalhada e disseminada publicamente num processo de combinação com o uso do preservativo, bem como também que a gente não continue reforçando estereótipos de que certos grupos são mais vulneráveis e são grupos de risco mais específico quanto a contaminação por esse vírus, porque isso ainda cria um imaginário social e uma ideia de que determinados grupos como gays, homens que fazem sexo com outros homens são grupos de risco, são vetores, os bissexuais podem ser considerados vetores, como uma galera conservadora disseminam um discurso de ódio afirmando que pessoas bissexuais são vetores de doenças e infecções sexualmente transmissíveis, então acho que a gente precisa conversar mais, tornar isso mais público, mas também num processo de educação em saúde que faça a gente romper com certos esteriótipos.

GB: Como você avalia o governo de Bolsonaro? 

Maya: O governo Bolsonaro de longe é o pior governo que a gente já viu, é um governo de um genocida, em que num período de pandemia que ocorreu aí durante os seus quatro anos de governo, ele fez um processo tão violento, de se negar a comprar vacinas, de fazer piada com aqueles que eram acometidos pela Covid e que em um processo de não responsabilidade com o que era, com o risco que a pandemia representava, que esse vírus representava e ainda representa para nossa população, mais de seiscentas mil pessoas perderam a vida por conta do vírus e por conta de uma má influência, de uma má gestão. Bolsonaro matou mais de seiscentas mil pessoas num período de pandemia porque não foi capaz e não foi capaz muito por também não querer estabelecer medidas de proteção contra o vírus, de incentivar o isolamento social, de incentivar e de garantir a compra de vacinas e incentivar a vacinação para a população para além de outras coisa. Bolsonaro tem um governo, uma gestão em que é marcada pelo conflito com as populações tradicionais, com os povos tradicionais do nosso país, indígenas, os quilombolas, no sentido de ameaçar a existência desses povos, no sentido de violentar e tirar a vida e a terra desses povos, é importante destacar que o Brasil é terra indígena e qualquer gestão ela precisa ser responsável com isso e querer avançar com o desgaste e a destruição do meio ambiente, a destruição dos nossos recursos naturais, destruição das comunidades tradicionais, é muito violento, é irresponsável, é uma política fascista. Além disso, Bolsonaro tem uma marca de perseguir mulheres, LGBTs, a negritude, no sentido de não colocar esses sujeitos concentrado nas suas pautas e pelo contrário incentivar a violência contra esses sujeitos e materializar uma violação de direitos. Muitos se orgulham da criação de um ministério da mulher por essa gestão, mas o que esse Ministério da Mulher tem feito pela mulher? A última cartilha da gestante que foi trazida a público era marcada por diversas violências obstétricas que estavam ali legitimadas num documento que partia desde espaço de governo, então sem sombra de dúvidas o governo Bolsonaro é um governo da morte, é um governo da perseguição, é um governo que não vê a população como ela realmente é e que pelo contrário deixa essa população passando fome, o governo Bolsonaro é marcado pela volta do Brasil ao mapa da fome e da miséria, em que nós fomos bombardeados com diversos relatos e imagens de pessoas que roubaram comida, de pessoas catando restos de ossos no carro de lixo para poderem se alimentar, então nós precisamos romper com essa lógica, avançarmos e precisamos derrotar Bolsonaro e o bolsonarismo no primeiro turno, no dia dois de outubro. E é importante também destacar que Bolsonaro não é uma figura isolada, é preciso que também para além da gente debater as eleições presidenciais, a gente debata a eleição de parlamentares no Congresso Nacional que sustentem políticas sociais de defesa da vida e defesa da população trabalhadora desse país, e que garantam, que não haja o impeachment de um presidente, que creio eu, será um presidente de progressista, de esquerda, na figura do Luiz Inácio Lula da Silva. Então, nesse sentido, nós precisamos de um parlamento que esteja verdadeiramente comprometido com as causas e com a vida das pessoas que constroem esse país, das mulheres, das LGBTs, da negritude, da periferia, das pessoas com deficiência, dos povos tradicionais e originários. Então, nós precisamos ser um parlamento comprometido com essas pautas e que sustentem uma lógica de esquerda em defesa da vida, em defesa da sociedade, da cidadania e dos direitos.

GB: Caso eleita, como sua militância influenciará na atuação como deputada federal? 

Maya: Eu inicio minha militância social, politicamente engajada quando eu estou na minha graduação em Biologia, lá na Universidade Federal do Ceará, construo a Entidade Nacional da Biologia e aí a gente vai tomando entendimento coletivo, de que as lutas devem ser coletivas e que a gente não pode fazer política sozinho, eu nesse processo em dois mil e dezesseis foi um ano marcado pelo golpe que destituiu a primeira mulher eleita presidenta do Brasil e que foi um golpe não somente contra as mulheres, mas que foi um golpe contra a democracia brasileira. Logo no pós golpe, a gente tem a proposta de projeto de emenda constitucional, que foi Intitulado e apelidado de PEC da Morte e congelou por vinte anos os investimentos em educação, saúde, segurança e que foi marcado por uma mobilização estudantil, em que nós ocupamos as universidades. Eu ocupei o departamento de biologia da UFC, em dois mil e dezesseis junto ao meu curso e essas mobilizações me marcaram o debate em defesa da educação pública de qualidade que tem investimentos e que possa funcionar em sua plenitude, nesse sentido e nesses espaços eu fui percebendo quem são os sujeitos que estavam dentro daquela universidade, quem eram os sujeitos que tinham mais dificuldade de permanecer nessas universidades e a gente começa a fazer um debate também sobre assistência e permanência estudantil e que é marcado por corpos que nunca foram vistos nos espaços universitários, nos espaços de tomadas de decisão, nos espaços de poder, são corpos que pouquíssimo ainda são vistos hoje, que esses espaços não foram pensados para eles, que são os corpos das mulheres, das LGBTs, da negritude, dos povos tradicionais, originários, pessoas com deficiência, então a política por assistência estudantil fez eu me organizar em um movimento social de juventude, eu sou organizada no Rua Juventude Anticapitalista e através da minha militância nesses espaços eu pude entender e conhecer o debate sobre os direitos das mulheres, direitos das LGBTs e a gente poder lutar e angariar espaços e conquistar mais direitos. Então, nesse sentido a minha construção com a juventude, com os espaços de militância dentro da universidade, das ocupações, com os espaços de construção do movimento LGBT, do movimento de mulheres, creio eu que esses acúmulos, que são acúmulos de alguns anos e de uma construção coletiva pautada na necessidade coletiva da vida das pessoas, da vida desses sujeitos, pode contribuir a minha atuação enquanto deputada federal que está referenciada e que vai estar sempre em diálogo com os movimentos sociais, que vai estar sempre em diálogo com aquelas e aqueles que realmente necessitam ser pensados na política e que a gente possa fazer política em coletivo que a gente possa ter um mandato de todas as lutas, que a gente possa ser um espaço de referência dentro do parlamento pra essas pautas que são tão caras e tão necessárias a essa candidatura e que são importantíssimas para a transformação da sociedade, quando a gente diz na nossa candidatura que é preciso transformar, a gente dizer que é preciso transformar com as mulheres, com a juventude, com as LGBTs, com a negritude, com os povos tradicionais originários, com as pessoas com deficiência. Enfim, é preciso transformar essa lógica de poder que não nos vê, que não nos pensa e é preciso transformar ocupando aquele espaço, é preciso transformar dizendo que nós não nos calaremos, que nós faremos políticas não só pra gente, mas com a gente. Então, acredito que esse espaço de construção na militância desde a minha adolescência, quando eu entro na universidade, vai fazer com que a nossa atuação enquanto deputada federal, caso eleita, seja uma atuação coletiva, referenciada e enraizada de movimentos sociais na luta coletiva.

Confira a lista de candidaturas LGBTQIA+ de 2022 neste link.

Lista de candidatos LGBTQ+ nas eleições 2022 | Deputados, Senadores, Governadores




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Jornalista gaúcho formado na Universidade Franciscana (UFN) e Especialista em Estudos de Gênero pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM)