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Há 30 anos, a OMS retirou a homossexualidade do catálogo internacional de doenças. No entanto, com a ascensão de governos conservadores e o ressurgimento de pautas antidemocráticas apoiadas por uma parcela da sociedade brasileira, a defesa e a manutenção dos direitos humanos tornou-se, novamente, um ponto sensível para a população LGBTQI+.

Em setembro de 2018, por exemplo, foi criada uma Ação Popular contra a Resolução nº 01/99 do Conselho Federal de Psicologia (que determinou que a homo/bissexualidade não são patologias e que, por não se tratar de uma doença, qualquer tentativa de tratamento ou reversão de orientação sexual configura-se como uma ação ilegal no país). Após um período de incertezas e de obscurantismo, em janeiro de 2020, por determinação do STF, essa Ação Popular contra a Resolução nº 01/99 foi extinta. Mas esse posicionamento a favor da “Cura Gay”, como ficou popularmente conhecida, deixou cicatrizes.
Isso porque, mesmo com os avanços políticos e sociais conquistados por pessoas LGBTQI+ nas últimas décadas, muitos/as profissionais da psicologia no Brasil ainda consideram a homo/bissexualidade um transtorno mental ou um desvio daquilo que se consideraria psicologicamente ideal para as pessoas. Essa visão parece ser motivada mais por crenças ou ideologias pessoais do que por evidências científicas que comprovem as supostas falhas ou desvios atribuídos à homo/bissexualidade. Inclusive, essa percepção se mantém, dentre outros motivos, pelo preconceito social que está vinculado nesses julgamentos. De acordo com a literatura, os/as profissionais com maiores níveis de preconceito frequentemente praticam intervenções para tentar mudar ou corrigir orientações não-heterossexuais.
No mês do Orgulho LGBTQI+, a Editora Taverna anuncia a publicação de Cura Gay. O livro é fruto da dissertação de Mestrado do psicólogo Jean Ícaro (PUCRS) e apresenta um panorama sobre as terapias conversivas no Brasil. Em sua pesquisa, o autor entrevistou 692 psicólogos/as de todo o país para investigar as motivações e a frequência com que tais profissionais ainda se propõem a tentar converter e corrigir pacientes lésbicas, gays e bissexuais em psicoterapia. Os dados coletados oferecem informações assustadoras: constatou-se que aproximadamente 1 em cada 3 psicoterapeutas se propõem a tentar a “terapia de reorientação” quando solicitado por um/a paciente e que aproximadamente 1 em cada 9 psicoterapeutas tendem a converter pessoas LGBs mesmo quando não solicitado pelo/a paciente.
É importante lembrar que mesmo em casos onde o/a paciente tenha solicitado, desde a regulamentação da Resolução 01/99 do CFP, esta é uma prática ilegal no Brasil. Devido a insuficiência de dados coletados no contexto da pesquisa, não foi possível apresentar uma amostragem significativa sobre o comportamento dos/as psicoterapeutas frente a pacientes transexuais, embora possamos inferir a mesma gravidade ou ainda pior para essa população.
Segundo o autor, quando se discute sobre as terapias conversivas estamos falando da oferta de procedimentos que não cumprem com aquilo que se propõem a fazer porque não são capazes de alterar o desejo ou o interesse sexual e romântico de uma pessoa; pelo contrário, produzem ainda mais sofrimento. Portanto, mesmo que muitos/as psicoterapeutas evoquem o princípio da liberdade profissional para converter pacientes lésbicas, gays e bissexuais durante seus atendimentos, não há autonomia para atuar acima das normas ditadas pelo órgão responsável pela prática profissional – o Conselho Federal de Psicologia.
O livro “Cura Gay” aborda um tema polêmico e complexo, porém extremamente necessário. Construída a partir de métodos científicos, a obra oferece informações atualizadas e inéditas sobre a realidade das terapias conversivas e apresenta, entre seus diversos tópicos, um apanhado histórico e teórico sobre a construção legislativa da criminalização da homofobia no âmbito nacional e internacional; como as diferentes vertentes da psicologia entendem a homo/bissexualidade e como esses conceitos se atualizaram no decorrer dos anos; além de trazer relatos de pacientes que passaram por terapias conversivas e de profissionais que defendem essas práticas. Cura Gay joga luz sobre condutas criminosas e é uma importante denúncia sobre a violência sofrida pela população LGBTQI+, que vê a garantia e a integridade de seus direitos ser questionada. Afinal, existe uma cura para o que não é doença?
Para viabilizar a publicação do livro, a Editora Taverna lançou esse mês uma campanha de financiamento coletivo no Catarse. Funciona como uma pré-venda, ao realizar a compra antecipada do livro os/as apoiadores/as contribuem com a arrecadação dos custos para execução do projeto e ainda recebem recompensas especiais. Saiba mais e apoie em www.catarse.me/cura_gay.
Sobre o autor
Jean Ícaro nasceu em Porto Alegre e graduou-se pela PUCRS em Psicologia. É especialista em Psicoterapias Cognitivo-comportamentais. Sua pesquisa de Mestrado em Psicologia Social pela PUCRS serviu de inspiração para este livro. É pesquisador e realiza palestras e workshops sobre este e outros temas relativos à diversidade sexual e de gênero, principalmente por pesquisas em cognição social. Jean Ícaro atualmente reside em SP, e atua como psicólogo clínico, especialmente para a população LGBT+.
Ficha técnica
Título: Cura Gay
Autor: Jean Ícaro
Editora: Taverna
Gênero: Psicologia
Capa: Carmela Caldart
Ano de publicação: 2020*
Encadernação: Brochura
Dimensões: 13 x 19 cm
Preço de capa: R$ 40,00
*Previsão de lançamento: primeira quinzena de setembro/2020.
Sobre a editora
Criada em 2017, a Taverna é uma pequena editora independente de Porto Alegre/RS que publica literatura brasileira e livros que discutem temas contemporâneos, destacando em seu catálogo a produção artística e intelectual de novos autores e autoras, de mulheres, de autoria negra e LGBT+.
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